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Naoshima: o Inhotim japonês

A abóbora mágica de Yayoi Kusama
Como em um conto de fadas, uma abóbora mudou o destino de um ilha de 3 mil habitantes no Seto Inland, onde o mar do Japão encontra o Pacífico. Naoshima tinha como principal atividade econômica a pesca e o refino da materiais para indústrias coordenadas pela Mitsubishi. Isso mudou a partir dos anos 80, quando Soichiro Fukutake e a Benesse Corporation - voltada para a educação, se transvestiram de fada madrinha e resolveram transformar o local em um point da arte contemporânea a céu aberto e que tem como ícone uma abóbora gigante da artista japonesa Yayoi Kusama instalada no Porto Myanoura (tem outra na praia de Gotanji).

Visão do Oval de Tado Ando
Desde então, a vocação da ilha mudou e contaminou as vizinhas Teshima e Inujima. Para entrar neste reino encantado, a viagem é longa e cheia de baldeações. O trem parte de Okayama para Uno Port (com uma troca) e de lá pegar o ferry boat até Naoshima. E já que é para curtir o baile, a experência fica mais completa se a hospedagem for na Benesse Art Site. Os preços são salgados, mas nada como passar a noite embalada por obras de arte. São 4 opções: Park, Beach, Museum e Oval. Neste último, são apenas 6 quartos e ligados a edíficio principal por um monotrilho. Os demais hóspedes, podem acessar o local apenas para um drink. Toda a ideia partiu da cabeça genial do arquiteto Tadao Ando que também desenhou os museus Chichu Art e o Lee Ufan, além de ter o próprio espaço para expor o seu processo de criação.

A comparação com Inhotim é inevitável. A essência é a mesma. Ambos atingem o objetivo de emocionar por meio do olhar.  Se Inhotim parece ter mais obras e ser mais compacto, Naoshima espalhou o conceito pelos bairros e outras ilhas. Se em Minas, os pavilhões são integrados a natureza pelos jardins de Burle Marx, lá o traço de união é o design de Ando.  Só que em termos de hospedagem e acesso, o Japão ganha pontos.

Chichu Art Museu
Ficamos dois dias lá e é um tempo suficiente para se deslumbrar e aproveitar com calma todos os pontos turísticos. O transporte é feito gratuitamente por vans em horários pré-determinados. Começamos com Chichu Art Museum - que significa por dentro da terra. E é exatamente abaixo da superfície que está a área de exibição sendo que o teto é aberto para a entrada da luz natural. Em uma sala totalmente branca, há 5 obras de Claude Monet da série das ninféias. Uma supresa no exterior é que o mesmo jardim está montado do lado de fora. Nos outros espaços, encontramos obras de Walter de Maria e James Turrell - ambos tem outras obras na ilha também. Já o artista Lee Ufan ganhou um museu só para ele, ressaltando sua obras em um ambiente minimalista.

No Benesse House, estão concentradas a maioria das obras com destaque para Andy Warhol, Basquiat, Yves Klein, David Hochney, Bruce Nauman e Yukinori Yanagi - que também tinha uma obra no meu quarto - e em seu entorno, as obras espalhadas pelos jardins e praia.

Aproveitando ainda a integração com os habitantes da vila, artistas ocuparam casas vazias e criaram o Art House Project. Um dos mais impressionantes é a instalação ‘Minamidera’, de James Turrell. Com hora marcada, você entra em uma sala completamente escura. É convidado a sentar em um banco. Aos poucos, o olhar vai se acostumando com a falta de luz. De repente, à sua frente vai surgindo um grande painel que vai do cinza ao branco. Depois, é a vez de andar pelo salão e perceber que na verdade é um vão aberto.

Ver o que não se via, sentir o que jamais sentiu. Naoshima proporciona isso e muito mais. Isso é um final feliz. Como não chamar isso de arte?


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